O brasileiro
adora modas! Sempre que aparece alguma moda nova, ele não para pra pensar se
essa moda é válida ou não: ele simplesmente a abraça, como um náufrago
abraçaria um tronco flutuando no meio do oceano. E a moda, agora, é o
politicamente correto. Todos vivem se policiando para não deixar escapar alguma
expressão ou atitude que possa ser considerada ‘politicamente incorreta’.
O ‘politicamente
correto’ começou como uma tentativa de se evitar algumas atitudes reprováveis,
como são os casos de racismo e de homofobia, entre outras. Porém, essa atitude
acabou sendo levada ao extremo, ocasionando alguns exageros. Vemos, atualmente,
muitas imbecilidades serem praticadas, protegidas pelo rótulo de “politicamente
corretas”.
É óbvio que
devemos evitar, a todo custo, casos de discriminação e preconceito. Porém, não
podemos deixar que isso vire uma obsessão e que passemos a ver ‘discriminação’
e ‘preconceito’ em
tudo. Determinadas palavras passaram a ser consideradas
pejorativas, e seu uso passa a ser considerado preconceito ou discriminação. A
língua passa a ser tratada como vilã, quando está apenas a serviço dos seus
falantes.
O que precisamos
compreender é que as palavras foram criadas para exprimir estados, impressões e
sensações, bem como para designar objetos – reais ou imaginários. Em todas as
línguas, encontramos o fenômeno da polissemia, quando uma mesma palavras
adquire vários significados, algumas vezes, opostos. Na Língua Portuguesa,
várias palavras adquiriram, ao longo do tempo, um sentido pejorativo. É o caso
da palavra ‘medíocre’ que, no início, designava algo comum, que estava na
média. Atualmente, a palavra tem sido utilizada com o significado de algo
‘ruim’, de ‘má qualidade’.
O mesmo vale
para as palavras ‘preto’ e ‘negro’, designando pessoas que, atualmente, estão
sendo rotuladas como ‘afrodescendentes’. Tanto negro como preto não são,
necessariamente, palavras pejorativas. O sentido que se passou a dar a elas é
que as tornaram pejorativas. Substituir estas palavras por ‘afrodescendentes’,
a princípio, não altera nada. Uma pessoa racista não deixará de sê-lo apenas
porque não pode mais dizer ‘negro’ ou ‘preto’.
O que tem que
ser mudada é a mentalidade das pessoas. No Brasil, anos após a escravidão, os
negros ainda não foram incorporados à nossa sociedade. Foram libertados para
continuarem sendo párias, assim como no tempo da escravidão.
Politicamente
correto não é ser proibido de dizer uma palavra, mas dar condição de vida digna
a todos os cidadãos do país, sejam eles mulheres, negros ou homossexuais. É
considerar todas as pessoas como sendo, realmente, iguais, e não apenas ver
isso como um preceito religioso ou uma prescrição da Lei, mas que não tem
nenhuma validade. É mudar a mentalidade das pessoas, não por meio de leis – que
apenas impedem a manifestação pública do preconceito e da discriminação, mas
que não os eliminam realmente –, e sim por meio de uma educação que mereça esse
nome (o que não ocorre com a tão propalada “educação” brasileira).
Para alguém
preconceituoso, ‘afrodescendente’ passará a ser utilizada como uma palavra
pejorativa. E cada nova palavra inventada será utilizada da mesma maneira.
Roland Barthes
dizia que a linguagem é fascista. Mas, na verdade, fascistas somos nós, que
utilizamos a linguagem para expressar os nossos mais sórdidos sentimentos e
ações. Pessoas e grupos que reclamam quando estão sendo oprimidos, passam a
oprimir quando têm a oportunidade. Todo mundo tem um pouco de Hitler.
No final das contas, tudo não passa apenas de uma
disputa pelo poder. E, nesse caso, voltamos a Barthes, que reconhecia que quase
nada estava fora do poder. Nem mesmo a linguagem!
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