Estava fazendo
uma faxina na minha biblioteca quando, ao remexer nos meus alfarrábios,
encontrei uma reportagem do caderno ‘Prosa e Verso’, do jornal ‘O Globo’,
datado de 11 de agosto de 2007. Esta reportagem, intitulada ‘Entre o delírio e
a razão’, comentava o livro “Deus, um delírio”, do biólogo Richard Dawkins.
Neste livro, Dawkins tenta destruir a figura de Deus classificando-o, como o
próprio título diz, ‘um delírio’. Com seu estilo cáustico, parecendo querer,
propositalmente, provocar polêmicas para chamar atenção para sua causa, ele não
poupa Deus, as religiões e os seus adeptos. Afirma que as religiões são
irracionais, criticando direta e indiretamente seus adeptos. O livro, que
pretende atingir os chamados ‘crentes’, usa o subterfúgio de parecer
direcionado para as pessoas que não acreditam em Deus. Logo no início do livro,
Dawkins escreve: “Sei que você não acredita num senhor barbado sentado numa
nuvem, então não percamos mais tempo com isso. Não estou atacando nenhuma
versão específica de Deus ou deuses. Estou atacando Deus, todos os deuses, toda
e qualquer coisa que seja sobrenatural, que já foi e que ainda será inventada”.
Neste pretenso desprezo aos adeptos das diversas religiões, como se não
estivesse escrevendo para eles, ele está justamente fazendo o contrário,
tentando convencê-las de que seu pensamento é algo completamente ridículo e sem
sentido.
Para defender a
ciência em detrimento do pensamento religioso, ele critica as religiões por
postular que se deve acreditar em seus dogmas e doutrinas sem que se precise de
provas, apenas por meio da fé. Completa que esse tipo de atitude é um ‘entrave
ao conhecimento científico’ e que incita as pessoas a atos extremos, como é o
caso dos terroristas que agem movidos por sentimentos religiosos, destruindo
construções e matando pessoas em nome de uma fé cega. Em suma, a religião é
algo extremamente pernicioso.
Curiosamente,
ele esquece-se de comentar que as armas usadas pelos terroristas – bombas,
armas químicas, rifles de longo alcance – são objetos criados pela mesma
ciência que ele tanto defende. Nesse caso, poderíamos nos questionar sobre o
que seria mais pernicioso: a religião ou a ciência?
A proposta deste
artigo não é defender nem um ponto de vista nem outro. Acredito que as pessoas
têm o direito de possuir as suas convicções, sejam elas quais forem. Assim como
Voltaire, posso não concordar com suas palavras, mas defenderei seu direito de
pronunciá-las.
Contudo, não
concordo com a proposta do autor de menosprezar aqueles que possuam um
pensamento diferente do seu, como se ele fosse o ‘dono da verdade’. Dawkins, ou
qualquer outro, tem o direito de defender suas ideias, desde que utilize
argumentos sólidos e ideias coerentes para isso, assim como as religiões
deveriam fazer o mesmo. Recuso o velho chavão ‘é a vontade de Deus’ que muitos
pregadores usam quando não possuem uma resposta coerente para uma pergunta
capciosa. Como eles podem saber que essa é, realmente, a vontade de Deus? Mas
não acho que se consegue chegar a algum lugar simplesmente ridicularizando as
ideias e pensamentos de outras pessoas, muito menos algo sério como suas
crenças que, muitas vezes, é a única coisa que elas possuem.
Não podemos
esquecer que, se a religião não consegue dar respostas para muitos
acontecimentos, a ciência também não consegue. Muitas questões estão sendo
debatidas há tempos pelos cientistas sem que se consiga chegar a um consenso,
com os cientistas apresentando várias concepções divergentes para um mesmo
ponto.
Muitos
cientistas acreditam em Deus e reconhecem que a ciência pode aproximar o homem
de Deus. Quem poderia dizer que a teoria da seleção natural não foi o processo
escolhido por Deus para a evolução de todas as espécies, incluindo o homem?
Um outro ponto
que a ciência talvez nunca consiga explicar sem admitir a existência de Deus é
a criação do Universo. Em um determinado ponto de uma entrevista que concedeu,
Dawkins questiona: “Como criador do universo, surge outro problema: quem teria
criado Deus? Ele teria que ter evoluído a partir de algo”. Questão
interessante, mas que poderia ser respondida com outra pergunta: ‘quem teria
criado o universo? Ele teria que ter evoluído de algo’. Ou Dawkins e seus
seguidores são tão pueris a ponto de acreditar que a matéria da qual nosso
universo é composto brotou do nada? Não é a própria ciência que tem como um de
seus postulados uma frase que diz que ‘na natureza nada se perde, nada se cria,
tudo se transforma’. Nesse caso, a primeira partícula de poeira cósmica teria
que ter se transformado a partir de algo, algo material. O que seria isso?
Partindo do pressuposto de que a matéria não aparece do nada, ela teria que vir
de ‘algum lugar’. Sem Deus, de onde ela teria vindo?
Sempre procurei
uma resposta coerente para esta pergunta, mas nem mesmo todos os programas do
Discovery Channel ou do National Geographic a que assisti conseguiram me
fornecer esta resposta.
Ou seja,
acreditar em um ser superior como sendo o criador de tudo o que vemos pode não
ser algo tão fantástico assim. A ideia de Deus tem uma certa lógica.
Independente de
existir ou não, a ideia de Deus deve ser respeitada. O que não podemos aceitar
são as explorações feitas em Seu nome. Pessoas que enriquecem à custa da crença
de pessoas pobres, que doam o dinheiro que utilizariam para comprar alimentos
para ‘Igrejas’ que pregam a humildade, mas que erguem templos magníficos e
cujos ‘pastores’ viajam em carros luxuosos, ostentam jóias caríssimas e vivem
viajando para o exterior.
Crer ou não
crer? Eis a questão?
Talvez, um dia,
a ciência consiga provar, de maneira irrefutável, que Deus não existe. Ou,
talvez, pode ser que ela descubra que Deus existe. Até lá, o melhor que temos a
fazer é aceitar ideias diferentes e convivermos em paz com pessoas que pensem
de maneira diferente de nós.
De pessoas
intolerantes, como Dawkins e Bin Laden, a Terra já está cheia.
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