Quem já passou
perto de dois idosos e conseguiu ouvir parte da conversa, já deve ter notado
que os temas utilizados por eles, geralmente, resumem-se a apenas dois: doenças
e a pensão da aposentadoria. Todos os outros assuntos parecem derivar de um
desses dois.
É incrível como
os idosos – não só eles, mas principalmente eles – adoram se queixar de
doenças, e até disputam quem está pior. Não é raro ouvirmos a seguinte
conversa:
- E aí, como
você está?
- Não muito bem.
Tenho sofrido com reumatismo.
- Hum! E eu?
Se alguém diz
que está com dor de cabeça, a dor de cabeça do outro é pior; se alguém tem
problemas de estômago, os problemas de estômago do outro é pior. Reumatismo?
Nem me fale! Você não sabe como tenho sofrido!
E as trocas de
receitas entre os “doentes”? Sempre que um reclama de alguma doença, aparece
alguém com a solução:
- Estou sentindo
umas dores abaixo das costelas, do lado direito.
- Ah! O filho da
empregada do meu vizinho sentia a mesma coisa. Tomou um chá de folha de
abacateiro com mel e gengibre e pronto. Foi tiro e queda!
E, então, o
outro vai e faz a tal receita de chá de folha de abacateiro com mel e gengibre
e toma. E continua sentindo as mesmas dores! E o pior é quando receitam
remédios. O ‘doente’ toma o tal remédio e, ao invés de ficar bom do problema
que sentia, passa a sentir outros. Além de não curar, o remédio acaba fazendo
mal.
Falar de doenças
leva a um outro assunto: a morte de conhecidos. Quando alguém fala de uma
determinada doença, alguém lembra que “o fulano morreu disso há um mês”. E aí
eles começam a lembrar de todas as pessoas que eles conheciam e que já partiram
desta para uma melhor. Entre eles, parece haver uma aposta: quem será o último
a morrer? Quem resistir mais tempo é o vencedor.
O outro assunto
que domina as conversas dos idosos é a pensão que eles recebem de
aposentadoria. E, muitas vezes, esse assunto deriva das doenças das quais eles
sofrem. Começam a falar de doenças, e aí falam dos remédios que compram e,
então, para falar de suas respectivas pensões é um passo.
Os idosos
parecem sentir um prazer masoquista em reclamar de suas pensões. Todos querem
ser aquele cara injustiçado, que recebe uma miséria. Um centavo recebido a
menos é motivo de orgulho.
- Eu recebo
oitocentos reais de pensão.
- E eu, que só
recebo setecentos e noventa e cinco?
Às vezes, você
escuta uma conversa em que os idosos estão falando mal do governo. Como eles
chegaram a isso? Começaram falando da pensão que recebem. Alguém reclamou que é
pouco. Outro disse que não dá para nada. Alguém lembra que, há muito tempo,
eles não têm um reajuste decente. Alguém diz que a culpa é do governo. Pronto!
A conversa descamba para a política. Mas a origem foi a pensão da
aposentadoria.
Muitos dos
nossos idosos não possuem alguma coisa com o que se preocupar. Assim, ficam
presos a coisas do dia-a-dia, rotineiras. Doenças, salários, pensões, falar mal
dos vizinhos. Se apegam a coisas mesquinhas como uma forma de se sentirem
vivos, úteis. Alguns se entregam à falta do que fazer e se tornam pessoas apáticas,
verdadeiros vegetais que, de fato, já morreram, mas que esqueceram de enterrar.
Zumbis vagando pelo mundo sem compreendê-lo e sem encontrarem seu lugar nele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário