A poesia brasileira sempre foi fértil em nos
presentear com grandes talentos ao longo do tempo. E, entre esses talentos, as
mulheres, talvez por sua maior sensibilidade, sempre brilharam no cenário
poético nacional. Poetisas como Cecília Meireles e Cora Coralina, entre tantas
outras, nos brindaram com páginas de pura sensibilidade e beleza. Em um cenário
geralmente dominado pelos homens, algumas mulheres brotaram como flores raras.
Uma dessas flores é uma poetisa que hoje é
desconhecida até mesmo de seus conterrâneos: trata-se de Violeta Branca que,
assim como a exótica Vitória-Régia, brotou das paragens amazônicas para exalar
seu inquieto perfume, desfazendo os miasmas que impregnavam a produção cultural
de Manaus na década de 30.
Violeta Branca foi uma transgressora em uma
sociedade conservadora e provinciana. Seus poemas denunciavam e criticavam essa
sociedade quando dizia que
O que me rodeia
Já não me encanta!
Seu primeiro livro, “Ritmos de Inquieta Alegria”,
já no título nos mostra o caminho que ela nos convida a trilhar. Ela não nos
convida para um plácido passeio, e sim para uma inquieta caminhada pela cidade
e por nós mesmos, em uma
(...) exaustiva
viagem
Sem calmaria e
repouso.
Violeta Branca publicou o livro “Ritmos de Inquieta
Alegria” em 1935, quando contava 20 anos de idade. No Brasil, o Modernismo já
havia ganhado adeptos e deixara de ser visto como algo estranho e como uma
espécie de não-arte. No Amazonas, entretanto, o Parnasianismo e o Romantismo
ainda vigoravam com uma certa força, influenciando leitores e autores.
Remando contra a maré, Violeta Branca desabrochou
exalando um perfume novo, que inebriava com o olor da novidade contra a mesmice
e a rigidez da época. Nos seus poemas, Violeta Branca rompeu com o formalismo,
renunciando ao rigor da metrificação tradicional e utilizando-se de uma
linguagem simples, o que a aproxima da primeira fase do modernismo.
Sua poesia é repleta de sensualismo, expondo os
desejos femininos e sua ânsia por liberdade em uma sociedade castradora,
principalmente em relação às mulheres. Sua proposta, de expressar os desejos e
paixões femininas, foi de uma extrema ousadia para as condições da época. Sua
intensidade nos remete à força e ardência que encontramos em Cecília Meireles,
como vemos no “Poema das tuas mãos”:
Tuas mãos imperiosas,
Tuas mãos rebeldes,
Cantam silenciosas
aleluias de gestos,
Quando compõem poemas
de volúpia,
Gritos incontidos de
alegria pagã,
Correndo ligeiras
Leves,
Toturantes,
No teclado branco de meu corpo...
Também encontramos em sua obra uma forte tendência
ao regionalismo, como podemos verificar em passagens como
Nos poemas que ora
escrevo
Não há, como outrora,
A suavidade de um
enlevo...
São ardentes,
tropicais:
Têm o cheirovde terra
molhada
E o gosto das frutas
maduras...
Violeta Branca foi uma voz dissonante que, ao
casar-se e mudar-se para o Rio de Janeiro, onde veio a falecer em 7 de outubro
de 2000, aos 85 anos, fechou-se durante algum tempo até que, em 1982, publicou
seu segundo e último livro, “Reencontro: poemas de ontem e de hoje”. Sua
inquieta e transgressora alegria ainda está no ar, nos incitando a uma viagem
onde
Transformei-me em
onda,
Para embalar no ritmo
diferente
A galera inquieta e
sem rumo
Do teu esquisito
destino de marujo.
O destino de um marujo que, assim como os poemas de
Violeta Branca, nos levam a uma viagem repleta de descobertas.
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